Bárbara Carine: a cientista baiana que transforma a escola e o pensamento brasileiro com uma educação antirracista

Foto: Divuglação
  • Júnior Patente
  • Atualizado: 08/12/2025, 12:49h

Em uma conversa inspiradora no programa Sem Censura, da TV Brasil, a professora, filósofa e influenciadora baiana Bárbara Carine reafirmou seu papel como uma das vozes mais potentes da luta por uma educação antirracista e plural no país. Mãe, doutora em química, escritora e pensadora, ela contou como sua trajetória pessoal — marcada pela força ancestral e pela resistência — deu origem a uma das experiências pedagógicas mais inovadoras do Brasil: a Escola Afro-Brasileira Maria Felipa, com unidades em Salvador e no Rio de Janeiro.

Raízes e resistência

Filha da periferia de Salvador e neta de uma mulher quilombola, Bárbara orgulha-se de uma história forjada na adversidade. “Minha mãe dizia: Carine vai pegar em livros e não em vassouras”, recordou, emocionada. Essa frase se tornou um norte para sua vida. Mesmo sem ter concluído a educação básica, sua mãe compreendeu a força transformadora do conhecimento e rompeu com um ciclo de exclusão que vinha desde os tempos da escravidão.

A leitura, conta Bárbara, foi o passaporte para sonhar um mundo possível: “Eu lia para viajar de avião, para ir a um outro país, para vestir a roupa que eu queria. A literatura me deu acesso a existências que me foram negadas.”

Barbara Carine – Foto: Arquivo pessoal

Da química à filosofia, da ciência à ancestralidade

A cientista explica que sua formação “não foi unilateral, foi total”. Nunca se permitiu escolher entre exatas e humanas: “Tudo me encantava. Eu queria entender o mundo por múltiplas lateralidades.”
Após se tornar doutora em química, Bárbara mergulhou mestrado e pós-doutorado em ensino de ciências, e daí nasceu o interesse pela filosofia — campo que a ajudou a compreender a relação entre conhecimento, cultura e poder. Seu pensamento hoje integra saberes afrocentrados e propõe uma revisão profunda sobre como a academia brasileira constrói suas verdades.

O Egito negro e a reconstrução do saber

Recém-casada com o também professor Thiago Tormes, Bárbara contou que escolheu o Egito como cenário de sua cerimônia simbólica não por acaso. “Kemet, como chamavam os ancestrais africanos, é a terra preta, berço da humanidade.”
Segundo ela, o apagamento da origem africana da ciência é uma das expressões da colonialidade do saber — o modo como o pensamento europeu impôs suas narrativas e silenciou a contribuição negra e indígena na história da humanidade. Em suas palavras, “a matemática, a geometria e até o teorema de Pitágoras têm raízes egípcias. O que chamamos de milagre grego é, na verdade, um mito eurocêntrico.”

PUBLICIDADE

A criação da Escola Maria Felipa

Inspirada pela filha Iana, adotada aos 6 anos, Bárbara percebeu a ausência de escolas alinhadas a uma formação antirracista. Assim nasceu a Escola Afro-Brasileira Maria Felipa, batizada em homenagem à heroína negra da Independência na Bahia.
“Criei a escola com a chegada da minha filha. Queria um lugar em que ela se visse representada, onde fosse protagonista do conhecimento”, afirmou.

O projeto, reconhecido oficialmente pela Secretaria de Educação, oferece 20% de suas vagas a crianças negras e indígenas em vulnerabilidade social, financiadas por campanhas de apoio mensal. Além de articular saberes africanos, indígenas e europeus, a escola propõe uma prática pedagógica que rompe com o padrão eurocêntrico de ensino.

Hoje, Bárbara compartilha a gestão da unidade carioca com a educadora Maju Passos e a atriz Leandra Leal, unidas pela maternagem e pelo compromisso com uma infância diversa e inclusiva.

A “intelectual diferentona”

Nas redes sociais, Bárbara se autodenomina “intelectual diferentona”, expressão que virou marca de sua popularidade. “Não quero ser a intelectual que as pessoas não compreendem. Quero ser lida, no sentido real da palavra. Quero dialogar com o povo”, explica.
Com humor, roupas simples e linguagem acessível, ela rompe com o estereótipo do intelectual distanciado. “Escrevo de modo coloquial, e a academia me negou por isso. Hoje, quando alguém diz que me lê e me ouve ao mesmo tempo, é o maior elogio.”

Comentários


Instagram

Facebook