Entenda a situação da Ocupação Beija-Flor, onde um grupo de moradores rurais enfrentam risco de despejo em Vitória da Conquista

Foto: Danilo Souza
  • Danilo Souza
  • Atualizado: 23/03/2024, 02:18h

Neste momento, em Vitória da Conquista, cerca de 30 famílias que vivem e trabalham com plantio de alimentos no Loteamento Chácaras Parque Imperial correm um iminente risco de despejo. Um documento feito pela Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana mostra que a posse pertence ao município de Vitória da Conquista, entretanto, terceiros que se denominam como proprietários da área moveram ações judiciais contra as famílias.

Como as famílias começaram a habitar o local?

A “Ocupação Beija-Flor” é composta por trabalhadores e trabalhadoras que encontraram na agricultura uma alternativa para ter renda e sobreviver, visto que a maioria deles estão atualmente desempregados ou atuam de modo informal nos chamados ‘bicos’. Segundo relatos dos próprios moradores, a ocupação iniciou em 2021, durante a pandemia da Covid-19, momento em que as famílias identificaram a área na região da Santa Marta e passaram a utilizar o local para moradia e plantações.

O trabalho das famílias no terreno

Os habitantes fizeram o plantio de alimentos como milho, mandioca, abóbora, feijão, maracujá, cana-de-açúcar, alface, entre outros. Os alimentos eram utilizados não somente para consumo próprio, mas também para realizar doações ao longo dos anos para creches e escolas públicas próximas da habitação. Além de utilizar da área para trabalho, os moradores também a utilizam como moradia, vivendo em casas simples e improvisadas. Alguns deles, em tom de brincadeira, chegam a apelidar as próprias moradias de “barracos”.

A casa de um dos moradores da Ocupação Beija-Flor. Foto: Danilo Souza

As primeiras ameaças

Em certo momento, que não foi especificado em uma data, as famílias começaram a notar que pessoas estavam cercando a área, permitindo que animais entrassem no terreno para pastar desde que um pagamento fosse feito a quem está se intitulando dono da terra, utilizando-se de um local público, já que é de posse da Prefeitura, para obter lucro. O nome da pessoa, ou das pessoas, que está reivindicando a posse não foi informado até o momento. Os moradores relatam também que essas pessoas não passam por nenhum tipo de necessidades financeiras, na verdade, possuem bens e renda em padrão elevado. Em um documento escrito pelo vereador Alexandre Xandó (PT), disponibilizado para a equipe de jornalismo da Mega Rádio, foram explicados mais detalhes a respeito da situação.

“[...] Desde o início do cultivo, há cerca de 01 (um) mês, estes (as) trabalhadores (as) têm lidado com inúmeros obstáculos, sobretudo com o poder de polícia exercido pela Guarda Municipal que reiteradas vezes interditou a comunidade dos trabalhos agrícolas, sem qualquer notificação por escrito. De acordo com os ocupantes, os proprietários vizinhos, que avançaram há anos sobre as terras do Município, não foram igualmente molestados. Além da Guarda Municipal, a Polícia Militar, sem nenhum mandado judicial, também vem lhes induzindo que saía da área, além das ameaças daqueles que, de maneira ilegal, reivindicavam a propriedade da área para lucrar em cima do patrimônio público”.

O documento pode ser acessado na íntegra clicando aqui.

O processo e o risco de despejo

A decisão da reintegração da posse, que pode ocasionar no despejo, aconteceu há cerca de uma semana, de acordo com um dos moradores da Ocupação Beija-Flor em uma conversa com a Mega. Xandó, durante seu pronunciamento na sessão da quarta-feira (20) na Câmara de Vereadores, em Vitória da Conquista, voltou a comentar a respeito da Operação Beija-Flor e o risco de despejo.

“Apesar de a gente já ter demonstrado que a área é da Prefeitura e que a Prefeitura reconhece que é dela, tem um processo tramitando como se fosse de um particular e a justiça determinou a reintegração de posse. [...] Eles são pais e mães de família que estão com colheita para fazer, o milho tá lá na véspera de ser colhido. Se tiver uma reintegração de posse, hoje a gente tem lá idosos e crianças que moram naquela área e que estão à beira de serem despejados. A Prefeitura precisa acompanhar isso, precisa se manifestar”.

Por conta do risco real de despejo, os moradores passaram a reduzir a quantidade de plantações, pois, caso isso aconteça, podem perder seus alimentos e o tempo dedicado ao trabalho. A Mega Rádio VCA foi até a comunidade nesta sexta-feira. O Sr. Josemário Soares, que vive e trabalha na ocupação, fez um relato sobre a situação.

“Nós tá trabalhando aqui tem dois anos, já vai fazer três que tamo’ aqui dentro, só que o pessoal nunca procurou a gente. Agora, quando chega essa época aí [aqui, o Sr. Josemario se refere a época política, já que 2024 é ano de eleições municipais], aparece esse despejo pra nós aí e pegou nós numa surpresa. Chegou esse mandato numa sexta-feira, três da tarde, para desocupar até segunda-feira, aí não tinha como a gente fazer nada. E aí nós tá’ aí com mão quebrada, sem saber pra onde vai, não tem casa pra morar, não tem um lugar para levar essas coisas… Nós tá’ sem saber o que vamo fazer. Aqui nós plantou milho, feijão, aipim, mas só que o meu eu perdi tudo esse ano. Ano passado eu ainda colhi, nesse eu não colhi quase nada”.

O Sr. Josemario Soares ao lado de plantações de milho feitas por ele. Foto: Danilo Souza

O ato em defesa da Ocupação Beija-Flor

Na manhã da sexta-feira (22), os moradores do local, ao lado do vereador Alexandre Xandó (PT), se reuniram na porta do Fórum Dr. Sérgio Murilo Napoli Lamego para realizar um ato em defesa da Ocupação Beija-Flor. De forma pacífica, os representantes expuseram cartazes e fizeram uso de uma caixa de som para expressar como se sentem a respeito da situação.

Ainda na mesma ocasião, uma caixa com alimentos produzidos pelos habitantes foi entregue no Fórum para simbolizar o ato. Houve uma tentativa de realizar uma conversa com a juíza, que não estava no local no momento, entretanto, foi representada por um outro funcionário do Fórum. Com a presença de um advogado, foi entregue, também, um documento que formaliza uma denúncia contra o processo de reintegração de posse.

Foto: Danilo Souza

Até o momento da publicação desta matéria, os representantes da Ocupação Beija-Flor seguem em suas moradias e enfrentam a incerteza da permanência. Durante a produção da reportagem, enquanto estávamos in loco, um carro não reconhecido pelos habitantes estava circulando próximo ao terreno, o que levantou mais suspeitas para os moradores. Esta é a situação atual das 27 famílias: viver um dia de cada vez e ficar atento a cada som ou movimento estranho, já que isso, infelizmente, pode significar que estão prestes a perder suas casas e seus trabalhos.

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